Componentes e Recursos da Educação à Distância: a integração
1. O Material Didático
2. O uso de Tecnologias na EAD
3. Usos Pedagógicos do Material Didático e das Mídias em EaD
4. A arte de estudar a distância
Integração de diversas mídias: impressas, eletrônicas e digitais
A integração das tecnologias impressas, eletrônicas e digitais (José Manuel Moran)
Estamos deslumbrados com o computador e a Internet na escola e vamos deixando de lado a televisão, o vídeo e o jornal, como se já estivessem ultrapassados, não fossem mais tão importantes ou como se já dominássemos suas linguagens e sua utilização na educação.
As tecnologias caminham para a convergência, para a integração, para a mobilidade e para a multifuncionalidade, isto é, para poder realizar atividades diferentes num mesmo aparelho, em qualquer lugar, como acontece no telefone celular (falar, enviar torpedos, baixar músicas...).
As tecnologias evoluem em quatro direções fundamentais:
Do analógico para o digital (digitalização);
Do físico para o virtual (virtualização);
Do fixo para o móvel (mobilidade);
Do massivo para o individual (personalização).
>>> Carly Fiorina, ex-presidente da Hpackard.<<<
Formas de integração das tecnologias na educação: tecnológica, pedagógica, comunicacional e humanística.
Integração tecnológica e pedagógica
A apropriação das tecnologias pelas escolas e universidades passa por quatro etapas, até o momento: a primeira é o acesso, o tê-las à disposição na secretaria, biblioteca, laboratório, salas de aula. Muitas escolas são deficientes, carentes de quase tudo. Apesar dos avanços nestes últimos anos, ainda reina uma profunda desigualdade: muitas escolas não têm acesso às novas tecnologias. Depois do acesso, precisamos de capacitação, de saber o que fazer com todas as tecnologias. Isto também não acontece de forma significativa em muitas escolas: a formação é pontual, burocrática e distante das necessidades reais.
As escolas ainda se sentem fortemente pressionadas pelas expectativas tradicionais das famílias, pela pressão do acesso às melhores universidades, pelo cipoal de normas das várias instâncias administrativas, pela força da cultura educacional convencional, pelo precário investimento público. Mesmo os colégios mais avançados tecnologicamente continuam apegados às aulas com transmissão de conteúdo, fragmentadas em disciplinas, com presença obrigatória e pouca flexibilidade e inovação.
As escolas que têm acesso às tecnologias costumam seguir algumas etapas na sua implantação:
1) Primeira etapa: tecnologias para fazer melhor o mesmo
As tecnologias começaram a ser utilizadas para melhorar o desempenho do que já existia: melhorar a gestão administrativa: automatizar rotinas de matrícula, boletos, notas, folha de pagamento, receitas. Depois ajudam o professor a “dar aula” na organização de textos (conteúdo), nos programas de apresentação, na ilustração de aulas (vídeos, softwares de conteúdos específicos), de avaliação (planilhas, bancos de dados), a fazer pesquisa (bases de dados e Internet). Ao mesmo tempo, os alunos encontram nas tecnologias ferramentas de apoio à aprendizagem: programas de texto, de multimídia, de navegação em bases de dados e Internet, de comunicação, até chegar aos ambientes virtuais de aprendizagem.
2) Segunda etapa: tecnologias para mudanças parciais
Numa segunda etapa, o avanço das tecnologias e o seu domínio técnico-pedagógico propiciam a criação de espaços e atividades novos dentro da escola, que convivem com os tradicionais: utiliza-se mais o vídeo para tornar as aulas mais interessantes; desenvolvem-se alguns projetos na Internet, nos laboratórios de Informática. Professores e alunos criam páginas e divulgam seus trabalhos. Professores propõem atividades virtuais de grupos, listas de discussão2, fóruns3 e mais recentemente blogs4 , programas de rádio (podcasts5), produção de vídeos. Esses programas se sofisticaram com a utilização de plataformas integradas de ensino, que permitem fazer atividades a distância. Mas o importante, o que vale de verdade, continua sendo o currículo, as aulas presenciais, as notas. Típico desta segunda etapa é a divisão entre a grade curricular obrigatória (disciplinas) e as atividades virtuais (projetos, webquests6...) que costumam ser voluntários ou considerados atividades complementares.
A escola continua a mesma, no essencial, mas há algumas inovações pontuais, periféricas, que começam a pressionar por uma mudança mais estrutural. Muitas escolas e universidades não fazem mudanças profundas mas, ao contrário, massificam com as tecnologias o modelo centrado no professor (por exemplo, através de teleaulas), focando mais a transmissão do que a interação e a pesquisa.
3) Terceira etapa: tecnologias para mudanças inovadoras
Numa terceira etapa, as tecnologias começam a ser utilizadas para modificar a própria escola e a universidade: para flexibilizar a organização curricular, a forma de gestão do ensino-aprendizagem. Trabalha-se mais com projetos integrados de pesquisa e há mais atividades semipresenciais. O currículo universitário permite atividades a distância complementares às presenciais. As escolas de Ensino Fundamental e Médio ainda se sentem fortemente pressionadas pelas secretarias de educação, pelo vestibular das universidades, pelas expectativas tradicionais das famílias e pela força da cultura escolar tradicional. Por isso, ainda não estão conseguindo quebrar o modelo padrão: aulas presenciais, presença obrigatória. Mesmo os colégios mais avançados tecnologicamente continuam amarrados, presos no peso da tradição e das expectativas sociais convencionais.
Um dos problemas sérios atuais é a demora das universidades em assumir novos modelos pedagógicos inovadores e mais séria ainda é a defasagem das escolas de educação básica: estacionaram na mesmice. Mesmo com grandes portais de serviços virtuais e franquias não mexem no essencial, que é o processo de ensino-aprendizagem. O virtual, até agora, é um complemento – só – do presencial, que é o que realmente conta e que continua acontecendo da mesma forma.
Integração comunicacional
As tecnologias facilitam a interação, a troca, a colaboração, mas não resolvem sozinhas os problemas de fundo: as dificuldades de entender-nos, de aceitar os outros como são, de compreender o mundo interior próprio e o dos outros. A educação é um processo que possibilita facilitar e expressar a comunicação em níveis cada vez mais profundos e ricos entre todos os participantes, fundamentalmente professores e alunos.
Quanto mais variedade de opções de informação-comunicação, mais fácil é dispersar-se, permanecer na superfície, nas aparências, no agito, nas interpretações da moda. A escola pode transformar-se em um espaço privilegiado de comunicação profunda, rica, aberta, inovadora, crítica; em um espaço de organizar, num clima de confiança e com a mediação dos professores, o caos informativo, de idéias, de avaliações, que precisamos enfrentar diariamente.
As tecnologias permitem hoje, como nunca antes, que professores e alunos se expressem de muitas formas e meios, por escrito, por áudio (rádio, programas de som na internet), por vídeo e multimídia (câmeras digitais, vídeos na Internet). A Internet possui hoje inúmeros recursos que combinam publicação e interação, através de listas, fóruns, chats, blogs. Existem portais de publicação mediados, onde há algum tipo de controle, e existem outros abertos, baseados na colaboração de voluntários. O site www.wikipedia.org/ traz um dos esforços mais notáveis no mundo inteiro de divulgação do conhecimento. Milhares de pessoas contribuem para a elaboração de enciclopédias sobre todos os temas, em várias línguas. Qualquer pessoa pode publicar e editar o que outras pessoas colocaram. Só em português foram divulgados mais de 30 mil artigos na wikipedia. Com todos os problemas envolvidos, a idéia de que o conhecimento pode ser co-produzido e divulgado é revolucionária e nunca antes tinha sido tentada da mesma forma e em grande escala.
A educação escolar precisa compreender e incorporar mais as novas linguagens, desvendar os seus códigos, dominar as possibilidades de expressão e as possíveis manipulações. É importante educar para usos democráticos, mais progressistas e participativos das tecnologias e das mídias, que facilitem a evolução dos indivíduos. O poder público pode propiciar o acesso de todos os alunos às tecnologias de comunicação como uma forma paliativa, mas necessária, de oferecer melhores oportunidades aos pobres, e também para contrabalançar o poder dos grupos empresariais e neutralizar tentativas ou projetos autoritários.
Integração humanística
Um dos grandes pontos de dificuldade da integração deve-se à tensão entre os educadores humanistas e os tecnológicos.
Os humanistas focam a comunicação, a interação, a construção do conhecimento, a criação de comunidades de aprendizagem. Os tecnológicos ressaltam o avanço dos softwares (programas), a velocidade de transmissão, as soluções telemáticas (a distância).
Os que conhecem as tecnologias têm nos prometido soluções, facilidades, grandes mudanças. Os que focam mais as dimensões humanas do ensino-aprendizagem falam mais de “olho-no-olho”, de comunicação afetiva, de valores.
Os humanistas dizem que as tecnologias são importantes, mas, em geral, resistem o quanto podem a uma utilização mais ampla, inovadora. Permanecem ancorados na sala de aula como espaço de resistência, fora do qual não se atrevem a avançar.
Os educadores tecnológicos, impulsionados por administradores em busca de resultados, ampliam mais e mais o número de alunos atendidos simultaneamente, focam predominantemente o conteúdo, a auto-aprendizagem e limitam a interação ao mínimo, para diminuir os custos e aumentar os lucros.
Precisamos dos educadores humanistas, que experimentem formas de interação virtual com a presencial, que nos ajudem a encontrar os caminhos para equilibrar quantidade e qualidade nos diversos tipos de situações educacionais em que nos encontramos hoje. Precisamos que eles nos mostrem como criar novas formas de interação, como incentivar a pesquisa individual e em grupo, a avaliação ao longo do curso, o estabelecimento de vínculos, a discussão aberta de valores importantes para a sociedade.
Precisamos dos educadores tecnológicos, para que nos tragam as melhores soluções para cada situação de aprendizagem, que facilitem a comunicação com os alunos, que orientem a confecção dos materiais adequados para cada curso, que humanizem as tecnologias e as mostrem como meios e não como fins.
É importante humanizar as tecnologias: são meios importantes; caminhos para facilitar o processo de aprendizagem. É importante também inserir as tecnologias nos valores, na comunicação afetiva, na flexibilização de espaço e tempo de ensino-aprendizagem.
Alguns endereços interessantes para educadores na Internet:
Notas:
1 Doutor em Comunicação. Diretor Acadêmico da Faculdade Sumaré-SP. Ex-Professor de Novas Tecnologias na Universidade de São Paulo. Textos sobre tecnologias na educação em: www.eca.usp.br/prof/moran
2 Lista de discussão permite que grupos de pessoas se comuniquem entre si continuamente: a mensagem que um envia chega a todas as outras e todo mundo pode responder, comentar ou colocar novas mensagens que chegam por correio eletrônico e que também podem ficar disponíveis numa página na Internet (como em www.grupos.com.br ou em http://br.groups.yahoo.com/).
3 O fórum é uma ferramenta que roda numa página na Internet e que permite a professores e alunos discutir alguns tópicos do curso, através de mensagens que são colocadas na página a qualquer momento, e que podem ser acessadas também a qualquer tempo e de qualquer lugar por quem entra naquela página.
4 Blogs são páginas interativas na Internet, utilizadas principalmente para contar experiências pessoais, de grupo e que também podem ser utilizadas por professores e alunos para aprender. Quando predominam as imagens chamam-se videologs ou vlogs.
5 Podcasts são programas de som, de rádio feitos na Internet e que podem também ser baixados e ouvidos por aparelhos tocadores de música MP3 como o I-POD da APPLE. 6 Webquest é uma metodologia de pesquisa em grupo de forma colaborativa, utilizando principalmente a Internet para buscar as informações. Duas páginas interessantes sobre essa metodologia podem ser consultadas em http://www.webquest.futuro.usp.br/ e em http://webquest.sp.senac.br/
PROGRAMA 3 - Do rádio à TV e ao vídeo em sala de aula
Limites e possibilidades do áudio e do vídeo na educação
Mathias Gonzalez de Souza1
Após uma releitura acurada dos trabalhos relacionados com o uso do rádio na educação permanente e continuada, nas últimas quatro décadas no Brasil, constata-se que os vários programas – desenvolvidos por instituições públicas e privadas, emissoras comunitárias, educativas, universitárias e comerciais – acumularam experiência em capacitar e instruir pessoas, em nível substancial, além de proporcionar entretenimento e lazer. Destacamos a década de 70 como a fase mais profícua do rádio no seu envolvimento com a educação continuada. O rádio foi largamente empregado na oferta de curso supletivo do primeiro e do segundo grau, como também na alfabetização de jovens e adultos, tendo o apoio pedagógico da mídia impressa, por meio de apostilas disponibilizadas em bancas de jornais e livrarias.
No atual momento, com o advento da Internet e das comunicações via satélite, acompanhamos o surgimento da terceira geração do rádio sobre IP (rádios para serem ouvidos exclusivamente pela Internet, também chamados web-rádios) cujo estúdio de produção e transmissão pode ser um simples microcomputador com recursos de multimídia, tendo no entanto alcance mundial.
No Brasil, até a data da elaboração deste texto, havia mais de cem web-rádios cadastradas no site www.radio.com.br, transmitindo programações de diferentes gêneros, tais como: jornalístico, musical clássico, pop e religioso, dentre outros. Apenas três emissoras transmitiam uma programação variada, intercalando música com pequenos blocos de informações culturais e de utilidade pública, abordando temas como saúde, meio ambiente e educação para o trânsito: Rádio Educativa Udesc – Florianópolis, Rádio Educativa Udesc – Joinville e Rádio Educativa Udesc – Lages, todas no estado de Santa Catarina. A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão-ABERT informa que, no Brasil, existem aproximadamente 3 mil emissoras de rádio comerciais e 7 mil comunitárias, sendo que esse número deve dobrar nos próximos dez anos.
Apesar de inúmeras iniciativas de entidades estudantis, comunitárias e mesmo particulares, na tentativa de preencherem a imensa lacuna existente no cenário nacional, para o uso do rádio como instrumento educativo, não existe, por parte dos governos – em suas instâncias federal, estadual ou municipal – incentivo à autoria e produção de programas puramente educacionais. Torna-se necessário que a educação informal ou sistematizada, desenvolvida por meio dessas novas tecnologias, possa ser apoiada numa pedagogia adequada e consciente das mudanças da Sociedade da Informação, cada vez mais exigente e ansiosa pelo conhecimento. Percebe-se que o imenso potencial educativo do rádio, quer através do sistema tradicional de transmissão em ondas de freqüência modulada (FM), ondas médias (OM), ondas tropicais (OT) e ondas curtas (OC) ou via Internet, está subutilizado, servindo essa poderosa mídia apenas para reproduzir notícias ou música de qualidade duvidosa, sem atender às reais e urgentes necessidades educacionais do povo brasileiro.
Torna-se necessário, sobretudo, que o rádio possa ser introduzido nas escolas, como recurso pedagógico, propiciando aos educandos a oportunidade de aprender a produzir e selecionar programas educativos de qualidade, exercendo um senso crítico sobre o que ouvem e recebem através das diversas mídias. Os educadores e produtores de programas da rádio devem estar atentos para evitar a mera transposição dos modelos educativos tradicionais que ainda oferecem uma educação bancária, sem questionamentos ou crítica. Devem, por outro lado, enfatizar e destacar o uso pedagógico do rádio, valorizando a aprendizagem colaborativa e participativa, que ressalte os valores individuais e coletivos e estimule os indivíduos a serem co-participantes do próprio processo de evolução, aprendendo a conhecer, a fazer, a conviver e a ser. Torna-se necessário projetar o nosso amanhã em termos educacionais, construirmos e consolidarmos esta sociedade, alicerçada pela ética, justiça e solidariedade, já que essas são competências que se aprendem. Daí entendermos a educação como um processo amplo, um projeto para toda uma vida, um bem ao qual se agregue valor permanentemente e possa ser promovido pelo uso de tecnologias que alcancem a todos.
Ao analisarmos o modelo de ensino tradicional – no qual o professor se posta diante dos alunos que, na maioria dos casos, assistem passivamente, sem direito a questionamentos, limitando-se a anotar aquilo que lhes é dito – verificamos que a introdução de novos recursos midiáticos, como a linguagem radiofônica televisiva, enseja uma maior participação e envolvimento dos aprendizes com os conteúdos disciplinares. Tal envolvimento é reforçador do processo de aprendizagem, já que transfere para o aluno uma maior autonomia e participação em todo o processo.
O áudio e o vídeo como mídias difusoras da aprendizagem
Não existem ainda informações e pesquisas suficientes capazes de embasar a suposição de que a simples introdução de um kit multimídia numa sala de aula, permitindo aos alunos o acesso a Internet, seja por si só uma variável pedagógica capaz de melhorar o desempenho dos envolvidos. Esta intenção preliminar, no entanto, apresentada em sala de aula, gerou visível entusiasmo e curiosidade e pareceu-nos, ao mesmo tempo, ser uma solução bastante acessível, já que não privilegiaria o acesso ao conteúdo a um grupo limitado de estudantes, nem restringiria esse acesso.
Muitas são as escolas que têm estabelecido projetos-piloto, por meio dos quais disponibilizam recursos básicos para instalação de uma rádio-pátio (mesa de som, tocador de CDs, microfone e caixas de som),ou mesmo projetos mais sofisticados, com o uso de computador, placa de captura de som e vídeo, webcams e gravador de CDs. Esses projetos educacionais, envolvendo recursos de áudio, têm produzido impactos visíveis no processo ensino-aprendizagem, além da animação e do entusiasmo com que os alunos e professores se envolvem colaborativamente para a produção de programas educativos, do tipo áudio-aula ou vídeo-aula.
É importante destacar, ainda, que as situações e as tarefas propostas em projetos dessa natureza são corrigidas e adaptadas conforme as necessidades da disciplina e as limitações da escola. Percebe-se que o próprio processo de construção de vídeo ou áudio-aulas, no qual se faz necessário um planejamento, desde a escolha da pauta, a pesquisa, a escolha dos apresentadores, as entrevistas, a gravação e a edição, procedimentos esses previamente estabelecidos, de forma tão completa e independente do trabalho realizado em sala de aula quanto for possível.
Muitos projetos desenvolvidos por escolas do Ensino Médio criaram estruturas próprias para o acompanhamento de atividades a distância, definindo-se a necessidade de utilização de um microcomputador dotado de navegador de Internet (Internet Explorer, Netscape Navigator ou similar), com o aplicativo (gratuito) RealAudio Player instalado. Tal aplicativo (e seu respectivo formato de arquivo) é, em geral, escolhido por dispor de uma excelente relação entre quantidade de áudio e tempo de transferência, evitando assim que os alunos sejam obrigados a aguardar durante dezenas de minutos para acompanhar apenas alguns segundos de aula – algo que seguramente aconteceria com os alunos sem conexão dedicada, caso o conteúdo fosse disponibilizado em vídeo.
Sem lugar a dúvidas, vivemos em uma sociedade de aprendizagem. Esta demanda por aprendizagens contínuas e massivas é uma das características que definem a sociedade atual. Mas não se trata apenas de aprender muitas coisas, senão de aprender coisas diferentes, por meios igualmente diferentes e em um tempo escasso, dado o grande volume de informações que devemos processar, e a velocidade de mudança e inovação, que nos exige o aperfeiçoamento constante ao longo de toda a vida.
Na busca de uma solução eficaz aos desafios propostos pela atual sociedade às organizações educacionais, surge a revalorização das modalidades de educação semipresencial e a distância. Essas modalidades educativas começam a se desenvolver em sua terceira geração, em que os recursos das mídias tradicionais – texto, áudio e vídeo – são potencializados a partir de sua fusão na Internet.
A Internet, essa poderosa mídia digital, otimiza e barateia a distribuição de informação audiovisual e textual, abrindo inúmeras opções educativas e surgindo como alternativa para responder ao escasso tempo de que as pessoas dispõem, à dificuldade de deslocamento no tráfego dos grandes centros urbanos e à impossibilidade de contar com os especialistas necessários em cada região para estruturar cursos e programas de alta qualidade.
Alternativas viáveis para a melhoria dos processos educativos
Uma resposta à complexidade dos processos que envolvem o ensino-aprendizagem e a urgência em formar indivíduos competentes, que a sociedade atual demanda, depende da criação estratégica de um espaço de produção e difusão de conhecimentos atualizados, em linguagem didática, através do uso de todo o potencial das novas tecnologias de comunicação e informação. Aí reside a inovação e a excelência em programas e cursos que envolvam o uso dos recursos midiáticos de massa, como o rádio, a TV e a Internet, ou ainda a integração de todas elas. A sala de aula é a célula-máter, a incubadora de tais projetos.
É fundamental que as escolas proporcionem uma oferta educativa que se constitua a partir do diagnóstico das necessidades de formação da população alvo e de suas características culturais, elemento central do planejamento educativo e das estratégias de comunicação, com ampla utilização de todos os recursos tecnológicos existentes, e que se caracterize pela elaboração de materiais diversos e adaptados a cada uma das realidades em que se desenvolvem as atividades educativas, não só no que diz respeito à elaboração de conteúdos conceituais, mas também às experiências de aprendizagem e às atividades do plano de ensino.
Espera-se que os gestores escolares apostem em estratégias pedagógicas dinâmicas, com programas que sejam atualizados permanentemente, respondendo ao acelerado ritmo de mudança da sociedade do conhecimento e do mercado de trabalho atual, superando assim o anacronismo em que, cedo ou tarde, caem os conteúdos escolares do modelo de ensino presencial.
Percebe-se que as instituições de ensino – quer sejam do nível básico, fundamental ou médio, ao desenvolverem uma sólida estrutura tecnológica e comunicacional, articulada por uma estratégia pedagógica que considere ações desenvolvidas para melhorar a comunicação entre os alunos e os docentes – têm obtido uma resposta positiva global no rendimento dos alunos e dos professores. Tais ações elevam a auto-estima de todos e de cada indivíduo, transformando-os em verdadeiros protagonistas de suas atividades de ensino e aprendizagem.
Ofertas educativas possibilitam tirar o estudante do marasmo e do tédio característicos da educação tradicional, permitindo-lhe criar, inovar e compartilhar experiências com os demais colegas, e têm produzido resultados altamente positivos. As trocas e o trabalho colaborativo em torno de projetos, tais como a construção de uma rádio-web para a escola, ou produção de um vídeo retratando a realidade do bairro, dota o estudante de um poder adicional de transferência a diversas situações da vida, constrói pontes para a formação de cidadãos conscientes de seus direitos, de seus deveres e, sobretudo, dos seus limites e potencialidades.
Uma proposta pedagógica que permita construir aulas globais, recorrendo aos especialistas de diferentes instituições, cidades e mesmo países, na formação de um corpo de professores altamente especializados em cada uma de suas áreas de conhecimento, provavelmente levará a uma difusão mais rápida e melhor do conhecimento, com ganhos para todos. Através de atividades diversificadas e abertas, tais estratégias podem favorecer a transferência de saberes aos mais variados contextos profissionais, promovendo a auto-aprendizagem, criando possibilidades para que o aluno aprenda a aprender e concedendo-lhe plena autonomia.
As linguagens atrativas e sedutoras do rádio e da televisão podem e devem ser apropriadas por alunos e professores e fazer parte do universo cotidiano educativo, a partir de projetos criativos e inovadores em sala de aula. Desta forma, a educação brasileira poderá enfrentar o desafio de transformar as velhas e empoeiradas salas de aula em ambientes atraentes e agradáveis aos nossos jovens, despertando-lhes o desejo de para lá se dirigirem, com uma renovada emoção de se sentirem parte de um projeto real de vida e não apenas agentes passivos desse processo.
Referências Bibliográficas
BIANCO, Nélia R. Del. Cadernos de Comunicação – Avaliação do Programa Escola Brasil. Brasília, Ministério da Educação, 2000.
BRUM, Eron. Política, o palco da simulação. Santos, A Tribuna, 1988.
COSTELLA, Antonio. Comunicação - do grito ao satélite. São Paulo: Mantiqueira, 1978. p. 36-120.
CORRÊA, Arlindo Lopes (ed.). Educação de massa e ação comunitária. Rio de Janeiro: AGGS/MOBRAL, 1979.
CUNHA, Célio da. A pedagogia no Brasil. In: LARROYO, Francisco. História geral da pedagogia. São Paulo: Mestre Jou, 1974. Apêndice, p. 880-915.
ESPINHEIRA, Ariosto. Rádio e Educação. São Paulo, Melhoramento, 1934.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 3a ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1975.
FREITAG, Bárbara. Escola, estado e sociedade. 6a ed. São Paulo: Moraes, 1986.
GONZALEZ, Mathias. Fundamentos de Tutoria em Ead. São Paulo, Avercamp, 2005.
LUCENA, Carlos. A Educação na Era da Internet. Rio de Janeiro: Clube do Futuro, 2003.
Ministério da Educação e Cultura/Movimento Brasileiro de Alfabetização. Educação permanente e educação de adultos no Brasil. Rio de Janeiro: Bloch, 1976.
Notas: 1 Escritor, psicopedagogo, gestor de Planejamento Educacional e Coordenador do Rádio Escola na Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação
PROGRAMA 4 - Comunidades de aprendizagem em Rede
Liane Margarida Rockenbach Tarouco1
Antes de iniciar a discussão da constituição e da manutenção de comunidades de aprendizagem em rede, cabe uma breve análise das condições atualmente existentes no Brasil para ensejar e apoiar as comunidades de aprendizagem em rede. A disseminação do acesso à Internet no Brasil segue crescendo e a taxa de crescimento aumentou, conforme se pode perceber pelo gráfico da figura 1, que consolida dados da pesquisa domiciliar realizada pelo IBGE (2005).
Fonte: Dados do levantamento domiciliar do IBGE (2005).
Isto representou, em 2005, cerca de 7.2 milhões de domicílios com microcomputador e acesso à Internet, num total de aproximadamente 53 milhões de domicílios.
Conforme destacado por Vecchiati (CGI/BR):
“Ainda que poucas pessoas percebam, estamos vivendo uma grande revolução. É uma revolução sutil, silenciosa, que já interfere e vai interferir muito mais na vida do cidadão. Ainda mais sutil que a interferência da TV na vida do ser humano. A Internet é a grande responsável por isso. Se compararmos com a revolução trazida pela televisão, veremos que o poder da Internet é muito maior: enquanto a TV possibilita uma comunicação de via única, a Internet oferece duas vias, o que permite a interação e a integração em rede das comunidades que dela participam.”
Mesmo nos casos em que não há computador e acesso à Internet em casa, o acesso está sendo buscado em outros locais, como mostra o gráfico seguinte, com a tabela resumindo os locais de acesso à Internet nos últimos 3 meses (CGI/BR).
De onde acessou a Internet nos últimos 3 meses
TIC (%)
Em casa 10,3
No trabalho (quando diferente de casa) 6,5
Da escola 5,2
Da casa de outra pessoa 4,3
Centro público de acesso gratuito 0,5
Centro público de acesso pago 4,3
Não acessou a Internet nos últimos 3 meses 75,6
Dos 24,4% entrevistados que acessaram a Internet nos últimos 3 meses, 10,3% acessaram em casa, mas apenas 7,7% têm acesso exclusivamente em sua residência. A maioria – 14,1% – não acessou a Internet de casa, mas de outros locais fora de seu domicílio, principalmente do trabalho, escola, casa de outra pessoa e centros de acesso pago.
Um outro resultado interessante da pesquisa do CGI/BR foi revelar que as gerações mais jovens, mesmo tendo menos renda, valorizam mais o computador e, por isso, dedicam parte maior dos seus recursos para a aquisição de um computador. Se alguém perguntar a um jovem, atualmente, o que pensa fazer para melhorar suas possibilidades no mercado de trabalho, receberá como resposta, na maioria esmagadora das vezes, que ele pensa fazer um "curso de computador" para conseguir um emprego melhor. A busca de alternativas de treinamento e educação através da Internet é, sem dúvida, uma motivação dos usuários e a pesquisa do CGI/BR aponta que, dentre os usuários que acessam a Internet, a comunicação e a educação ocupam posições majoritárias:
Atividades desenvolvidas na Internet concernentes a treinamento e educação, em percentual (%)
Treinamento e educação 56,45
Realizar atividades escolares 47,05
Outras atividades relacionadas à educação 29,39
Cursos de extensão e pós-graduação 4,69
Atividades desenvolvidas na Internet- Comunicação - Percentual (%)
Comunicação 81,67
Enviar e receber e-mail 70,51
Enviar mensagens instantâneas 34,74
Participar de chats 28,21
Participar de sites de comunidades e relacionamentos (ex. Orkut) 21,97
O que este panorama permite entrever? Foi constatado, na pesquisa do CGI/BR, que as gerações mais novas estão vislumbrando uma perspectiva de melhoria associada ao acesso à Internet. Esta percepção intuitiva dos jovens é corroborada por diversos autores, que ressaltam ser a educação a pedra básica sobre a qual deve ser ancorado todo o esforço de desenvolvimento e aprimoramento da qualidade de vida dos povos. E uma das formas de promover um melhor nível de escolarização, bem como a readaptação e a recapacitação de quem que já está no mercado de trabalho, é através da educação continuada. A educação formal e a educação continuada podem ser ensejadas através da Internet, mas a forma como o processo de ensino/aprendizagem deve passar a ocorrer neste contexto é, sem dúvida, diferente de como tem sido desenvolvido tradicionalmente.
Como alunos e professores podem e devem passar a atuar? O novo papel do estudante passa a ser mais ativo, autodirigido (heutagogia, conforme referido por Paloff, 2005), em que ele deve ser capacitado a aprender a aprender usando interações colaborativas. Mudanças precisam ocorrer e uma das mais significativas é uma ampliação no processo de aprendizagem colaborativa. O uso da Internet potencializa a aprendizagem colaborativa, e o aprender e o comunicar constituem duas das principais atividades dos usuários da Internet, conforme anteriormente destacado. Na aprendizagem colaborativa: o aluno aprende com seus pares e o educador orienta, medeia e anima o processo de construção do conhecimento (Lotito 2005). Com isso, cria-se oportunidade para o trabalho em rede e o desenvolvimento da capacidade de cooperar, aprender, acessar e produzir informação, que será uma habilidade exercida não apenas na fase formal do processo educacional, mas principalmente no decorrer da carreira de cada um, pois a educação continuada constitui uma demanda imperiosa do mercado de trabalho, em constante transformação. Mas o aprender neste novo contexto e, em especial, o aprender em grupo requerem novas habilidades. O surgimento de comunidades de aprendizagem em rede representa uma oportunidade e uma alternativa indispensável neste novo contexto de aprendizagem.
Lotito destacou também que as principais características de uma Comunidade Virtual de Aprendizagem são:
1) A comunicação não depende do tempo nem do local, o que oportuniza a participação de quem está envolvido em outras atividades, profissionais, acadêmicas, ou mesmo pessoais, que a inviabilizariam.
2) A comunicação se dá entre muitas pessoas e, neste contexto, a realimentação é mais rica e contextualizada.
3) O produto é coletivo. O conhecimento humano é essencialmente coletivo e a vida social constitui um dos fatores essenciais da formação e do crescimento dos conhecimentos pré-científicos e científicos.
4) Os participantes são ativos. Trazem suas experiências e conhecimento.
5) A escrita é estimulada. E esta demanda pode contribuir para levar à redução do problema do analfabetismo funcional. Adicionalmente, também prepara para a sociedade, em que o fator de produção relevante é o conhecimento, e que requer um indivíduo conhecedor, informatizado, digital, que interpreta linguagens icônicas.
6) A comunicação ocorre por meio do computador conectado à Internet. As ferramentas atualmente disponíveis vão bem além do correio eletrônico que, no início, era a base da interação das comunidades de aprendizagem em rede. Atualmente chats são utilizados em formas puramente textuais ou em ambientes gráficos, como o Palace, com cenários onde avatares representam os participantes do grupo, que assumem personalidades e, através dos mesmos, interagem no grupo (figura 2). As mensagens instantâneas constituem, atualmente, não apenas uma ferramenta de lazer, mas são utilizadas no suporte a estudantes e na comunicação síncrona entre os integrantes da comunidade e já agregam recursos multimídia (intercâmbio usando voz, vídeo e co-trabalho em quadro branco)
7) Pode haver um mediador que anima, incentiva e viabiliza o debate, fazendo evoluir a comunicação em um sentido. Este constitui um papel relevante para os professores e tutores no contexto das comunidades de aprendizagem em rede: estimular, acompanhar a pesquisa, debater os resultados. Orientar, estimular, relacionar, mais que informar, é a função primordial do mediador. Faz-se necessário, neste contexto, um modelo de gestão adhocrático, conforme referido por Fichmann (2006), no qual são reduzidos os ingredientes de formalidade e impessoalidade, oferecendo maior autonomia aos atores que participam de um projeto, e com hierarquia imprecisa, na qual as pessoas mudam de papel de uma situação para outra.
8) A motivação dos participantes é muito importante. Um dos pilares desta motivação é uma sensação de reciprocidade, que passa a vigorar na comunidade de aprendizagem em rede, quando cada participante sente-se recompensado pelo retorno que o grupo proporciona. A recompensa pode ser cognitiva (aprendeu com o grupo e busca dar continuidade ao processo de aprendizagem colaborativa) mas pode também ser afetiva e/ou emocional (recebe reconhecimento do grupo).
Figura 2: Ambiente de chat gráfico
A capacidade de procurar informação relevante e discriminar o que é importante do que é acessório, ou mesmo irrelevante, também constitui uma das habilidades requeridas neste cenário. Uma nova forma de ler, que não mais demanda versões impressas de documentos para serem trabalhados e que emprega práticas de leitura dinâmica, é necessária para perceber com eficiência o que interessa e que precisará ser objeto de atenção mais intensa. Esta forma de buscar informação, na qual as páginas da Internet são velozmente recuperadas e avaliadas em relação ao seu potencial de usabilidade é, ao mesmo tempo, uma característica positiva e negativa. A busca incessante de mais e mais informações para posterior aproveitamento pode levar a um esgotamento do processo nesta fase. O fenômeno, referido com Infoglut, leva a uma voraz acumulação de informações, sem que uma apropriada análise sobre as mesmas seja realizada. Esta voracidade derivou de um processo em que a carência de informação era intensa para uma nova situação na qual há abundância de material, revistas on-line, tal como a RENOTE (2006) e todo o acervo que a CAPES (2006) possibilitou em seu portal Periódicos, com acesso on-line a revistas tradicionalmente disponibilizadas apenas em forma impressa. Isto nos leva à seguinte indagação: Como desacelerar este processo, para ensejar a reflexão, que é essencial para a aprendizagem significativa? Novos hábitos de trabalho em grupo, fluência com ferramentas de comunicação, cooperação e coordenação precisam ser aprendidos e exercitados.
O trabalho do grupo Mídia Informática e Internet do Programa de Formação em Mídias na Educação da Internet buscou criar condições para desenvolver esta fluência, com as ferramentas de autoria pelo professor, para que ele possa criar condições e estímulo para a nova forma de ensinar e aprender que utiliza comunidades de aprendizagem em rede.
Referências Bibliográficas
CAPES. Portal de periódicos. Disponível em http://www.capes.gov.br. Acessado em outubro de 2006.
CGIBR. Pesquisa Sobre o uso das tecnologias da informação e da comunicação no Brasil 2005.Comitê Gestor da Internet no Brasil.
IBGE. Pesquisa domiciliar. Disponível em http://www.ibge.gov.br . Acessado em outubro de 2006.
Fichmann, Silvia. Gestão, transdisciplinaridade e comunidade virtual de aprendizagem: uma utopia pragmática. São Paulo: Centro de Educação Transdisciplinar – CETRANS/ Escola do Futuro da USP – EFUSP.
Lotito, Márcia. Comunidade virtual de aprendizagem: o ambiente do portal educarede. 2005. Disponível em http://www.educarede.org.br. Acessado em Outubro de 2006.
Palloff, Rena e Pratt, Keith. O aluno virtual. Porto Alegre: ARTMED, 2004.
RENOTE. Revista Novas Tecnologias na Educação. UFRGS/CINTED. Disponível em http://www.cinted.ufrgs.br/RENOTE/ Acessada em 2006.
Nota:
Professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS/CINTED.
PROGRAMA 5 - A importância da gestão nos projetos de EAD
O papel da gestão na integração do uso das mídias na escola e as possibilidades da formação a distância na formação do educador
Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida1
Maria Elisabette Brisola Brito Prado2
Fica decretado que, a partir deste instante,
Haverá girassóis em todas as janelas,
Que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra,
E que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
Abertas para o verde onde cresce a esperança! (Trecho do Poema “Estatutos do Homem”, de Thiago de Mello).
A temática deste texto evidencia a necessidade de abordarmos três conceitos que se apresentam de forma inter-relacionada: a gestão, a integração das mídias na escola e a formação a distância do educador.
O que é a gestão?
O conceito etimológico de gestão indica vários sentidos relacionados com a ação de gestar, trazer, gerir, administrar, dirigir, proteger, abrigar, produzir, criar, ter consigo, nutrir, manter, mostrar, fazer crescer, digerir, pôr em ordem, classificar... (Houaiss, 2001).
De acordo com Almeida (2006), a noção atual de gestão vai muito além da concepção de organização administrada como máquina, cujo funcionamento é facilmente controlado e abrange tanto a gestão de informações e conhecimentos gerados na própria instituição ou advindos de outros contextos, como as complexas relações que se estabelecem na diversidade de interesses e pontos de vista, englobando as múltiplas dimensões constitutivas do ser humano (cognitivas, sociais, políticas, pedagógicas, técnico-administrativas).
Os processos de gestão constituem a tessitura de redes de significados e sentidos, que articulam as competências e habilidades individuais daqueles que atuam na instituição com as práticas, valores e crenças desse contexto e, ainda, com inúmeros elementos que interferem continuamente em sua vida e funcionamento.
Portanto, a concepção de gestão enfatiza a práxis humana, considerando que os sujeitos se constituem no trabalho. À medida que desenvolvem suas produções, os sujeitos se transformam, produzem sua realidade e são transformados por ela.
A questão que se coloca é qual a relação entre a gestão e o uso integrado das mídias na prática pedagógica?
O uso das mídias no contexto escolar requer um novo aprendizado do professor, que vai além do saber operacional dos recursos midiáticos (Prado, 2003; Almeida, 2005). Relembrando a chegada dos computadores nas escolas, o maior desafio era propiciar ao professor saber usar pedagogicamente os recursos computacionais de forma contextualizada com os conteúdos curriculares. O que se desejava era que a incorporação do computador na escola ocorresse de fato, demandando novas práticas do professor e viabilizando aos alunos novas formas de aprender e de representar o conhecimento. De igual maneira se desejava fazer o uso, com sentido pedagógico, de outras mídias, como a TV, o rádio, DVD, máquina digital, a filmadora, a Internet...
Isso aconteceu? De uma maneira diversificada e pontual podemos dizer que sim. Algumas experiências, mais localizadas, aconteceram revelando resultados bastante positivos em termos de propiciar ao aluno o aprendizado baseado na autoria, criatividade, produção de conhecimento e na aprendizagem por meio da exploração de simulações. Tudo isso potencializado pelas características inerentes da tecnologia digital de expressar o pensamento, registrá-lo e recuperá-lo a qualquer tempo e de qualquer lugar, permitindo atualização constante e levando a fazer, analisar e refazer esse processo continuamente.
Entretanto, também aconteceu ou ainda acontecem práticas de utilização das mídias na escola de maneira dicotomizada das demais atividades, ou mesmo como um apêndice da intencionalidade pedagógica do professor. Muitas vezes, um assunto é trabalhado na sala de aula usando as tecnologias mais habituais como livro, caderno, caneta... E, num outro momento, fragmentando o próprio trabalho pedagógico, o aluno usa, por exemplo, o computador para digitar algo, buscar uma informação ou simplesmente fazer uma cópia, sem estabelecer relação com os conteúdos estudados na sala de aula. Quando isto acontece, o uso das mídias e tecnologias acaba empobrecendo o processo de aprendizagem do aluno e deixa de trazer inovações para a prática pedagógica.
Isto significa que dar acesso aos recursos tecnológicos e midiáticos à comunidade da escola (alunos, professores, diretores, coordenadores, funcionários) é necessário e fundamental, entretanto, não é suficiente. É preciso ir além, potencializando a apropriação destes recursos com significado para quem os utiliza. Dito de outra forma, permitindo que cada protagonista do contexto escolar aprenda a operacionalizar tais recursos, reconhecendo as especificidades das diferentes mídias e, principalmente, as implicações envolvidas na sua utilização, na perspectiva da função e do papel que cada protagonista desempenha, empregando-as para resolver os problemas que enfrenta em seu cotidiano e para atender às suas necessidades e aos seus interesses.
Tratando-se do professor, a apropriação das diferentes mídias na sua atuação em sala de aula requer a reconstrução do conhecimento sobre a própria prática pedagógica. Nesse sentido, envolve repensar a concepção de aprendizagem, a sua coerência em termos de ensino e abordagem pedagógica e o conhecimento curricular sendo trabalhado de forma articulada com os recursos das mídias e tecnologias, o que indica tanto a necessidade de dominar as operações e funcionalidades básicas das tecnologias, como a necessidade de entender a linguagem das mídias (Prado, 2005).
Com a integração das tecnologias e mídias na prática pedagógica se evidencia a importância de o professor compreender os processos de gestão da sala de aula, no que se refere ao ensino, à aprendizagem e às estratégias que desenvolve, na criação de situações que favoreçam ao aluno integrar significativamente os recursos das tecnologias e mídias, como forma de trabalhar a busca de informação, a pesquisa, o registro, as novas linguagens de expressão do pensamento, comunicação e produção do conhecimento. De fato, este caráter complexo traz um outro sistema de representação simbólico, que provoca a conscientização do professor sobre a necessidade de desenvolver a gestão da prática pedagógica e dos recursos que utiliza.
No entanto, fazer a gestão da prática pedagógica é algo novo para o professor. Não podemos nos esquecer de que o professor foi preparado para planejar o ensino, dar aula, transmitir informações, passar e corrigir exercícios e provas para os alunos. E agora, diante de um novo cenário da educação, ele precisa lidar com a rapidez e a abrangência de informações, de dados, com o dinamismo do conhecimento e com a integração de tecnologias e diferentes formas de representação. Evidencia-se uma nova organização de tempo e espaço de aprendizagem, que ultrapassa a estrutura da instituição escolar, bem como a diversidade de situações que exigem do professor um posicionamento crítico e reflexivo para fazer suas escolhas e definir suas prioridades em relação às atividades a desenvolver, de acordo com as condições da realidade em que atua e dos recursos de que dispõe, desenvolvendo estratégias criativas e novas aprendizagens.
As novas relações com o saber que as tecnologias e mídias propiciam, principalmente com o acesso à Internet, potencializam a articulação da escola com outros espaços produtores de conhecimento, desencadeando mudanças substanciais em seu interior, apontando para a criação de um espaço complexo, aberto e flexível, no qual a gestão da prática pedagógica e a aprendizagem se desenvolvem em um processo colaborativo de enfrentamento das problemáticas contextuais, por meio de trocas recíprocas, respeito, co-responsabilidade e (re)construção de conhecimento. Assim, a escola vai recuperando seu lócus de espaço aglutinador de saberes, produtor e disseminador de conhecimentos, que se alarga para além de seus muros e adentra os espaços virtuais, ignorando as fronteiras geográficas e temporais.
Daí a necessidade e a urgência de propiciar a formação continuada e em serviço de educadores, para que possam identificar e analisar as formas adequadas e construtivas de fazer a gestão da sala de aula, que pode se abrir para o mundo com o uso das tecnologias e mídias integradas nas dinâmicas das situações de aprendizagem dos alunos. E tal formação pode ser viabilizada por meio de ambiente virtual de aprendizagem.
Por que formação a distância, via ambiente virtual?
As questões relacionadas à EAD, até um tempo atrás, predominavam em torno de assumir uma posição a favor ou contra, uma vez que essa modalidade de ensino trazia uma preocupação para os educadores em termos da sua qualidade e, conseqüentemente, da aprendizagem do aluno. No entanto, no final da década de 90, com o avanço da tecnologia e a disseminação da Internet, a EAD ganhou um novo foco de análise, evidenciando novas questões e envolvendo, de forma híbrida, aspectos de caráter tecnológico e educacional. Com isso, as preocupações passaram a girar em torno das diferentes abordagens educacionais de EAD veiculadas com o suporte das plataformas computacionais, denominadas de ambientes virtuais.
Sob esse enfoque, pode-se destacar um leque de possibilidades que transitam desde uma abordagem de EAD baseada no broadcast (distribuição de informações) até outras abordagens que priorizam as interações e o processo de construção de conhecimento. A nova perspectiva de EAD é denominada por Valente (2000) com o “estar junto virtual”, que se caracteriza por uma concepção de ensino que enfatiza o ato de aprender por meio das interações e no desenvolvimento de atividades reflexivas e de autoria, favorecendo o processo de reconstrução do conhecimento. Na abordagem do “estar junto virtual”, a mediação pedagógica é centrada no acompanhamento e na interação do professor com o aluno e entre os alunos. O professor, com base no acompanhamento investigativo do processo de aprendizagem dos alunos, faz a gestão da prática pedagógica no contexto virtual, recriando novas estratégias, desafiando cognitivamente os alunos na busca de superações de conflitos e de atingir novos patamares de aprendizagem (Valente, Prado e Almeida, 2003; Almeida, 2005; Prado e Almeida, 2006).
No contexto virtual, evidencia-se uma nova maneira de aprender que ocorre a partir do estabelecimento da rede colaborativa entre os participantes, a qual vai sendo construída por meio das interações e das produções coletivas que acontecem nos vários espaços virtuais propiciados pelas diferentes ferramentas tecnológicas disponíveis. Nessa rede de aprendizagem, o aluno expressa e registra suas idéias, compartilha suas reflexões e produções via escrita, lê os registros deixados pelos colegas, apropria-se deles e faz novas intervenções, recriando as idéias originais. Assim, a interação em rede proporciona vivenciar diferentes momentos de compartilhar significados, fazer releituras e desenvolver a meta-reflexão. É nessa rede de interações que a importância do papel do outro fica evidenciada, enquanto interlocutor das ações e reflexões práticas e teóricas (Rossetti-Ferreira, Amorim, Silva e Carvalho, 2004). Nessa perspectiva, a rede se sustenta e se enriquece pela diversidade de olhares, potencializando a cada um comparar, estabelecer novas relações, diferenciações e vivenciar situações reflexivas e criativas que envolvem buscas coletivas e em grupos de soluções e de produção de conhecimento (Almeida e Prado, 2006).
Outra possibilidade oferecida pelo contexto da EAD é a formação continuada de educadores, que pode ser viabilizada na ação, ou seja, contemplando nas atividades do curso as reflexões e intervenções sobre os elementos constituintes do cotidiano do educador e de sua prática profissional. O aprendizado na ação – ou contextualizado – lida com os fatos reais. Essa característica, sendo um dos princípios do curso de formação continuada, favorece ao educador reconhecer a funcionalidade daquilo que está aprendendo-fazendo e, conseqüentemente, atribuir significado e sentido para a própria aprendizagem (Prado e Valente, 2002; Almeida, 2004). Além disso, enquanto membro de um grupo em formação, o educador tem os colegas do curso como parceiros, com quem compartilha experiências, recebe apoio diante de dificuldades e espelha-se em suas conquistas. Tem também, no professor responsável pela formação, a orientação para enfrentar os desafios e tomar consciência de que o desenvolvimento da autonomia, propiciado pelas novas aprendizagens, lhe dá a sensação de empoderamento sobre a gestão da sala de aula.
Essa forma de aprender permite ao profissional da prática ter uma compreensão localizada em relação ao universo da sua atuação, o qual poderá ser ampliado por meio do estabelecimento de novas relações, envolvendo diferentes níveis de influências que atuam em seu entorno de ação. Portanto, a compreensão ampliada completa as compreensões localizadas e abre caminho para novas sistematizações da prática e da teoria (Prado e Valente, 2002; Prado, 2003).
Daí a necessidade de entender que as novas características de aprendizagem implicam novas estratégias para a elaboração da proposta de um curso a distância, a qual se desenvolve ancorada em princípios educacionais articulados com práticas comunicacionais viabilizadas pelas tecnologias de suporte e mídias incorporadas ao curso. Entretanto, o desafio é grande quando as propostas de cursos envolvem maior quantidade de alunos e de turmas. Há necessidade de ter estrutura tecnológica e uma logística de trabalho pedagógico e de gestão muito bem articulada para lidar com o quantitativo de alunos, mantendo o qualitativo da formação dialógica, contextualizada e reflexiva.
Para compatibilizar os princípios educacionais do “estar junto virtual” com as características de uma nova configuração contextual de curso em grande escala, é necessário fazer a composição das equipes de concepção e desenvolvimento de projetos de EAD, considerando-se as distintas competências exigidas para a produção e o desenvolvimento de cursos mediatizados por tecnologias, os novos papéis que desempenham e o trabalho em parceria entre os componentes de diferentes áreas de domínio (Ferreira, F.C. et al., 2005; Prado e Almeida, 2005). Além de envolver a participação de diversos profissionais, é necessário recriar novas estratégias de trabalho na equipe e entre as diversas equipes, bem como formas de gerenciamento da documentação gerada no curso durante a sua realização, incluindo instrumentos de acompanhamento, dados estatísticos, relatórios e avaliações em processo para realimentar as análises e as decisões que possam garantir, no quantitativo, o aspecto qualitativo da EAD. E para isto é essencialmente necessário fazer a gestão de EAD numa perspectiva de rede. Uma rede humana articulada que veicula interações e (re)organização no contexto da rede tecnológica e permite estabelecer conexões entre o olhar micro sobre as necessidades e participações individuais com a visão macro sobre o panorama da globalidade, para compreender a complexidade da gestão em EAD e agir na emergência das demandas contextuais, respeitando as diretrizes políticas e as prioridades institucionais.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, M. E. B de. O Projeto Gestão Escolar e Tecnologias: concepção e história. In: Fernando José de Almeida e Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida. Liderança. Gestão e tecnologias. Para a melhoria da educação no Brasil. PUC/SP, Microsoft, 2006.
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FERREIRA, F.C.; SAPUCAIA, F.; RUBIM, L.C.; VILLARINHOS, M.C.; PRADO, M. E. B. B.; ALMEIDA, M.E.B. de. A complexidade e a complementaridade de saberes e competências profissionais na implementação de um projeto de formação de gestores escolares via Internet. In: II Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, Vitória, ES, 2005.
HOUAISS, A. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
PRADO, M.E.B.B. Integração de Mídias e a reconstrução da prática pedagógica. Série Integração de tecnologias, linguagens e representações. Rio de Janeiro: TV Escola, SEED-MEC, 2005.
PRADO, M.E.B.B. Educação a Distância e Formação do Professor: Redimensionando Concepções de Aprendizagem. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, PUC-SP, 2003.
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_________ . A formação de gestores para a incorporação de tecnologias na escola: Uma experiência de EAD com foco na realidade da escola, em processos interativos e atendimento em larga escala. In: 12º Congresso Internacional de Educação a Distância – ABED, Florianópolis, SC, 2005.
ROSSETTI-FERREIRA, M. C.; AMORIM, K. de S.; SILVA, A. P. S.; CARVALHO, A. M. A. Rede de significações e o estudo do desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artmed, 2004.
VALENTE, J. A. Educação a Distância: Uma oportunidade para mudança no ensino. In: Maia, C.(coord.). Ead br: Educação a distância no Brasil na era da Internet. São Paulo: Anhembi Morumbi, 2000.
VALENTE, J. A.; PRADO M. E. B.; ALMEIDA, M. E. B. de (orgs.). Formação de educadores via distância. São Paulo: Avercamp, 2003.
Notas:
Licenciada e Bacharel em Matemática; Mestre e Doutora em Educação pela PUCSP; Professora do Departamento de Ciência da Computação e do Programa de Pós-graduação em Educação: Currículo, da PUCSP. Coordenadora do Projeto Gestão Escolar e Tecnologias, desenvolvido pela PUCSP, em parceria com a Microsoft Brasil e com Secretarias de Estados de São Paulo, Goiás e CONSED com outros nove Estados. Pesquisadora e consultora na área de formação de educadores, tecnologia na educação, educação a distância e inclusão digital.
2 Pedagoga e Mestre em Psicologia Educacional pela Faculdade de Educação da UNICAMP, Doutora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo da PUCSP. Atualmente participa da Equipe Gestora do Projeto Gestão Escolar e Tecnologias, desenvolvido pela PUCSP, em parceria com a Microsoft Brasil e com Secretarias de Estados de São Paulo, Goiás e CONSED com outros nove Estados. Atua como pesquisadora colaboradora do NIED-UNICAMP e como consultora na área de formação de educadores, tecnologia na educação e em educação a distância.
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